quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

 

AMOR DA MINHA VIDA

OU

ENZO E ALANA

 Dr. Afranio Bastos

         Nós não tínhamos nenhum parente. Morávamos no interior do Paraná.

Morávamos em uma bonita casa. Meus avós maternos moravam conosco. Eram os nossos únicos parentes.

O meu avô era muito rico. Ele tinha uma indústria de componentes eletrônicos. Digo tinha, pois, estava muito idoso e não conseguia mais controlar os negócios. Ele já havia vendido tudo e aplicado todo o dinheiro em nome de meu pai.

O meu pai acabara de se aposentar como professor universitário.

Em uma manhã de domingo fomos para a igreja eu, mamãe e papai. Meus avós ficaram em casa. Em um dado momento, da igreja, nós ouvimos um barulho enorme. Uma explosão e todas as pessoas que estavam na igreja saíram correndo assustadas. Ah, meu Deus. Que tristeza! A explosão fora na nossa casa e, ela estava sendo consumida por um volumoso incêndio. Rapidamente chegaram os bombeiros, mas, não conseguiram salvar meus avós. A casa foi toda consumida pelas chamas.
           A minha mãe sofreu muito. Todos nós sofremos. Mas, eram os pais dela. O laudo pericial constatou que fora um vazamento acidental de gás. Ela quis se mudar de cidade.

Meu pai comprou um sítio no litoral do Espírito Santo. Nada conhecíamos por lá, mas, a minha mãe queria mesmo aquilo, ficar longe de lembranças tristes.

Eu tinha cinco anos de idade. Era um sítio lindo com uma mansão mais linda ainda. Uma cachoeira barulhenta caía de um penhasco coberto de gigantescas árvores e, no solo, corria formando um fundo rio de águas claras. Pacas e capivaras corriam para o rio, amassando o capim alto e espantando o bando de coloridas borboletas que lá iam pousar.

Acabávamos de chegar. Já era quase noite. Nenhum vizinho por ali. Apenas uma orquestra de pássaros estava lá. Acho que para nos receber.
          Descarregado o caminhão de mudanças, meus pais decidiram deixar para arrumar tudo no dia seguinte. A minha mãe fez uma gostosa sopa e fomos dormir. O meu pai ainda ficou um pouco acordado ouvindo rádio e, tomando o seu vinho de todas as noites.
          Era noite, não muito tarde quando o meu pai, ainda acordado, ouviu um choro de criança. Parecia na porta da casa quando ele acordou a minha mãe, eu também acabei acordando. Fomos ver e, tinha uma criança em uma caixa de papelão na varanda de nossa casa. Logo, sem demora, estava frio, a minha mãe pegou a caixa com a criança.
          __Meu Deus. Veja Artur, uma criança abandonada, e é uma menininha. Parece que tem poucos dias de vida.
          __Olha Alice, tem um envelope dentro da caixa.
          Antes de ver o que tinha dentro do envelope, meus pais saíram da casa, procuraram em volta e não viram ninguém. Aquele resto de noite foi uma festa só. Ninguém mais dormiu. A cada minuto mais nos apaixonávamos por aquela criaturinha meiga. Só quando o dia amanheceu é que o meu pai disse que iria avisar as autoridades na cidade e, a minha mãe, já apaixonada pela criança, não deixou.
          __Não, não Artur. Ninguém sabe da criança, vamos ficar com ela.
           __Nós não podemos fazer isso, Alice. Alguém pode dizer que nós a roubamos
           __Espera, ainda não vimos o que tem no envelope que estava dentro da caixa junto com a bebê. Vamos ver primeiro.

          Dentro do envelope havia uma carta pedindo para que cuidassem daquela menininha linda. Era uma carta grande e, junto com a carta, uma certidão de nascimento e um pen drive. O nome da criança era Alana Schneider. Pai desconhecido e, a mãe, Alessandra Schneider. Resolveram ler a carta, que era grande e dizia:
“Peço a quem encontrar essa bebezinha linda, de quinze dias de vida, que a criem para mim, mas, não quero que ela pense que vocês são os pais dela. Eu quero que ela saiba que teve uma mãe que morreu sem poder criá-la. Quero apenas que a eduquem. Quero uma casa para ela crescer, uma cozinha onde comer, mas, por Deus, quero que ela cresça sabendo que eu sou a sua mãe, não quero que ela pense que é adotada. Eu era a única parenta dela. Não temos mais parentes. Eu morava com o meu pai que era viúvo. Quando eu me engravidei o meu namorado me abandonou. O meu pai ficou sabendo e foi atrás dele na Argentina. Nós morávamos em Santa Maria no Rio Grande do sul. Não tínhamos mais parentes. Ao se encontrarem, meu pai e ele, Em Buenos Aires, após uma briga tamanha, trocarem tiros e ambos faleceram. Eu morava de aluguel. Eu trabalhava em uma loja de informática. Quando chegou o dia do parto eu me internei no Hospital Universitário. Tive parto normal. No próprio Hospital eu registrei a criança. Assim que tivemos alta do hospital eu peguei um ônibus e vim para o mais longe possível. Durante a gravidez eu descobri que era portadora de uma doença grave. Osteosarcoma já com múltiplas metástases em vários órgãos. A medicina me deu poucos anos de vida. Até pensaram que eu não conseguiria levar a gravidez a termo. Eu sabia que iria falecer e, a minha princesinha acabaria em um orfanato. Não conheço vocês. Criem a minha bebê, mas, por favor, não a deixem pensar que ela é sua. Pode parecer estranho, mas, ela deve crescer achando que é minha. No pen drive estão todas as fotos de minha gravidez e, durante o parto, no Hospital, assim ela vai me conhecer e me amar. Adeus.”

          O dia amanheceu e, decididos a ficar com a criança, meus pais foram até a cidade comprar roupas para a bebezinha e, leite em pó. Era simples, dizia minha mãe, ninguém nos conhece e, portanto, podemos atender o pedido da mãe dela. Não temos outra saída. Se não concordarmos temos que entregá-la a um juizado de menores, o que a mãe morta não quer. Podemos falar que é filha de uma empregada. Ou não falamos nada. Vamos atender o último desejo da mãe dela, conforme ela pediu. Vamos atendê-la exatamente como ela pediu. Alana vai crescer amando a sua mãe verdadeira, espiritualmente.
          Alguns quilômetros depois, no caminho da cidade de São Mateus, ainda na estrada do sítio, policiais se preparavam para tirar um corpo que estava pendurado em uma árvore, vítima de enforcamento. Poucos curiosos observavam. Também meu pai parou o carro. Verificaram que era o corpo de uma jovem. Estava sem documentos.
          Em São Mateus, uma linda cidade do litoral norte do Espírito Santo, meus pais compraram um lindo enxoval para a bebezinha, alimentos para ela e para nós. Em conversa em uma loja de roupas infantis, também ficaram sabendo que a moça encontrada morta não era da região, que estava sem documentos e muito emagrecida. Chegaram a ver uma foto em um jornal da cidade. Tinha um belo rosto.
           Aproveitaram para levar a criança em um pediatra e começar o esquema de vacinação.

          Voltaram radiantes para casa. A etapa seguinte, antes mesmo de começar a desmontar as caixas da mudança, fomos ver as fotos do pen drive. Estava bem registrada a gravidez e o parto. Não tiveram dúvidas, a suicida era a mesma das fotos do pen drive. Poderiam ficar tranquilos que ninguém poderia tomar a bebezinha. Lamentaram muito o destino da jovem suicida e da sua história triste.

          Meus pais começaram a organizar a mudança, mas, primeiro montaram o berço que compraram na cidade. Era lindo o berço. Conforme combinado, a companhia de mudanças chegou para montar os móveis.

          Depois de toda mudança organizada, meu pai pegou o pen drive e, com a minha mãe junto, foram à cidade, procuraram um estúdio de fotografia. Contrataram um serviço longo. Pediram que fosse feito um lindo álbum com as fotos do pen drive. Pediram também, que duas das melhores fotos da mãe suicida, uma no início da gravidez e outra mais na metade gravidez, quando já aparecia o abdome gravídico, mas, a mãe ainda parecia estar bem de saúde e, que, depois fossem feitos dois painéis ocupando duas paredes do quarto da bebê, do chão ao teto. Queriam que a vontade da mãe fosse cumprida da melhor forma que pudessem fazer. Desta forma a criancinha cresceria junto com as lembranças de sua mãe.

            __Meu nome é Enzo. Eu saí para conhecer melhor a nova moradia, o nosso sítio. Que lindo! Que lindo... A barulhenta cachoeira enche a sua queda de gotículas cristalinas onde se desenha um majestoso arco-íris. Montanhas azuis se erguem no horizonte, de onde uma leve brisa desce para beijar a sinfonia da cachoeira e acariciar um cenário de paz e tranquilidade. O lugar ideal para a minha mãezinha se acostumar com a ideia da trágica morte de seus pais, meus avós que ainda amo muito. Se eu fosse um poeta diria, que tudo aquilo era um pedaço do Espírito Santo tocado pelas mãos de Deus, ou, para os incrédulos, um toque mágico de uma fada benfazeja.
          Eu fui até o rio que nascia da cachoeira. Uma revoada de pássaros voou do capinzal, assustados com a minha presença. Um bando de capivaras se aquecia ao sol, observado o rio e se alimentando de plantas aquáticas. Ficaram assustadas e fugiram quando me viram. Fui andando pelo capim a beira rio, quando me assustei com um animal morto e um filhotinho chorando ao lado. Corri a chamar o meu pai. Ele veio.
          __Meu filho, é uma fêmea de lobo Guará. Está morta. Parece que foi atingida por um tiro, coitada. Quanta maldade, meu Deus. Vamos enterrar a loba e cuidar do filhote. Parece que viemos aqui para cuidar de filhotes dos outros, não, meu filho?
          __Que bonitinho, papai. Posso ficar com ele?
          __Sim. Vamos domesticá-lo. Mas, bonitinho ele não é.
          __Ah! É sim, papai.
          O meu pai era um cara legal. Ele fez um buraco bem fundo, colocou o corpo da loba dentro, cobriu com terra e ainda fez uma cruz com galhos de árvore amarrada com barbante e colocou na sepultura. Depois ele observou bem a beleza do lugar que se estendia até as longínquas montanhas azuis e balbuciou que seriamos felizes ali.
Voltamos para casa para mostrarmos o meu lobinho para a mamãe...
         __Artur, você está louco? Vai deixar nosso filho brincar com um lobo?
         __Não, Alice. Ele é recém-nascido e vai crescer domesticado. Amanhã vamos levá-lo a um veterinário em São Mateus. Ele vai nos orientar como cuidar dele. Agora, Enzo, vá arrumar os seus brinquedos em seu quarto, Ajude-nos a acomodar as coisas da mudança.
          __Sim, papai. Depois eu posso brincar com Alana?
          __Pode sim, mas, depois que der mamadeira para o seu lobinho.
          No dia seguinte levamos o filhote a um veterinário em São Mateus. O profissional foi muito claro sobre o destino do pequeno filhote.
          __É ilegal manter um animal silvestre em cativeiro. Você não pode ficar com ele. Vou ficar com ele para ver se está com alguma doença e depois vou entregá-lo às autoridades competentes. Mas, estou sentindo que você vai chorar. Não fique triste. Eu vou lhe dar um filhote lindo. É um filhote de Husky Siberiano que eu tenho para vender. Mas, não vou cobrar de você. Eu vou lhe dar de presente e você deixa o lobinho para eu o levar para onde ele vai crescer e ser readaptado à natureza e, no momento certo, vai retornar à mata de seu sítio.
E, indo até a área de criação, pegou um filhote e deu para Enzo que ficou radiante com a beleza do animal.
          __Olha papai. Que pelo lindo!
          __Que engraçado, filho, ele tem um olho azul e o outro castanho...
          __Isto se chama heterocromia. É muito lindo. Leve-o, cuide bem dele. É um filhote macho.
          __Ele já tem nome, Doutor?
          __Sim. Por causa das cores diferentes dos olhos dele, eu dei o nome de Bowie.
          __Como? Bowie?
          __Sim, em homenagem ao cantor David Bowie que também tinha heterocromia.
          __Quanto eu devo pela consulta, Doutor?
          __Nada. O seu filho já pagou me ajudando a devolver o lobinho à natureza. Você, Enzo, pode visitar o Centro de Recuperação de Animais Silvestres sempre que quiser. Assim o lobinho vai se acostumar com você e, quando ele crescer e for solto na mata de seu sítio, ele e você poderão ser amigos. Vou escrever o endereço. Todas as manhãs eu estou lá. Me procure e eu facilito a sua amizade com este animalzinho. Combinado? Aqui está o endereço.
          __Combinado. Irei lá sim. Obrigado pelo Bowie.
          __De nada. Vão com Deus.
          __Vamos Bowie...
          Meus pais se davam muito bem. Aquela fortuna que, em vida, meu avô já havia aplicado em nome de meu pai, não poderia ficar parada, desvalorizando. Os dois se perdiam conversando o que fazer. Nós não conhecíamos todo o sítio. Atravessamos o rio de barco e, pela primeira vez fomos caminhar do outro lado próximo à mata densa. Confesso que ficamos com medo. Medo de algum animal feroz sair daquele pedaço de mata virgem, mas, apenas pássaros, pombas e borboletas pareciam nos dar as boas-vindas. Era realmente um lugar encantador, era mesmo o que a minha mãe necessitava para amenizar a perda de seus pais tão tragicamente. Enquanto passeávamos meus pais mantinham a conversação sobre empreendimentos e, decidiram apostar em turismo hoteleiro.
          Assim que chegamos em casa foram direto para a internet e já se matricularam em um curso técnico de hotelaria à distância. Ficaram muito empolgados que muito se dedicavam aos estudos online. O meu pai era engenheiro civil aposentado, ex-professor universitário. A minha mãe assistente social, também aposentada.
          A empolgação era sem limites. Traçaram um plano cuidadoso. Como o meu pai era engenheiro civil, sempre a empolgação pesa para este lado. Os dois velhos amantes inseparáveis, temendo a velhice e a possibilidade de necessitarem de serem assistidos em casas de repouso, para não falar em asilo, futuramente, chegaram a um plano mirabolante, enquanto estudavam com afinco o curso técnico de hotelaria. Iriam investir em hotéis moradia definitiva para idosos. Velhos sem parentes, aposentados, velhos pais de filhos que trabalham e não conseguem dar uma assistência carinhosa, velhos de famílias das grandes cidades que adoram frequentar o litoral e não tem onde deixar os seus. Sim. O mercado era grande. Meu pai já voltou para a sua prancheta aposentada e começou a rabiscar o projeto dos apartamentos.
Já desenhou um apartamento. Muita iluminação, ausência de degraus. Portas largas. Sala confortável, quarto espaçoso com grandes armários de portas deslizantes com cofres em seu interior, com suíte onde todas as portas, inclusive do banheiro, eram largas, cadeiras de banhos retráteis no banheiro, seguradores de metal no banheiro e próximo ao vaso sanitário. Cozinha com o espaço necessário contando com fogão elétrico, micro-ondas e moderno sistema de conservação de alimentos. Quem não quisesse usar a cozinha, um refeitório com alimentação balanceada estaria à disposição.
A minha mãe observou que tudo estava perfeito e, agora, seria comprar terrenos e começar a construir. Só que meu pai já estava além.

          A ideia era ter hotéis no litoral do Espírito Santo. Procurando em sites especializados, meu pai viu que, muitos hotéis que haviam sido construídos visando a copa do mundo em 2014, no Brasil, estavam fechados e à venda. Ele procurou uma imobiliária autorizada e foi ver um destes prédios. Em uma frequentada praia capixaba, um luxuoso prédio, hotel, de doze andares estava fechado e, conforme observou, com uma dívida imensa. Em princípio meu pai buscou os credores e fez uma negociação que servisse a ambas as partes e conseguiu comprar o prédio. Depois de todos os trâmites legais, contratou uma empreiteira e começou a reformar o hotel abandonado. Ao mesmo tempo, comprou imóveis ao lado e projetou uma fantástica área de laser e esportes.
Dois anos depois o hotel, o primeiro de uma programada rede, estava autorizado a funcionar.

          Uma empresa especializada em propaganda, imediatamente, jogou anúncios em todas as mídias. A procura e reservas esgotaram as vagas em uma semana. A maioria do Estado de Minas Gerais, muitos do Estado do Espírito Santo e, idosos solitários de muitos Estados do Brasil. Em alguns meses todo o sistema estava funcionando.

          Um selecionado e cuidadoso cadastro de médicos, fisioterapeutas, nutricionistas e fisioterapeutas, todos independentes do hotel, estavam no rol de consultas dos familiares dos moradores. A grande maioria usava os serviços de refeição do hotel. Alguns poucos usavam a cozinha de seu apartamento.
          Que inteligente projeto fez o meu pai. O lucro era imenso. Em cinco anos, onze destes hotéis funcionavam nas praias capixabas. O meu pai multiplicava a herança recebida de meu avô.

          Eu e Alana frequentávamos escola de tempo integral em São Mateus. Eu já tinha dez anos e, Alana, cinco. Aos finais de semanas e feriados colegas, meus e dela, iam conosco para o nosso sítio. Meu pai já havia construído uma bela estrutura de diversão desde quadra poliesportiva, patinação, corrida musculação e piscina. Por isso todos gostavam de passear lá. Às vezes esquecíamos a piscina e nos atrevíamos em divertidos banhos na cachoeira cristalina e barulhenta que terminava no lindo rio de águas claras. Uma ritmada orquestra de pássaros embelezava a nossa diversão. Coloridas borboletas na vegetação ribeirinha e, pequenos animais da mata frequentadores do rio já não fugiam com a nossa algazarra.

          Alana, tão linda com os seus cinco aninhos, não se desgarrava de mim. Até me impedia de me aproximar das bonitas garotas de minha turma, adolescentes como eu. E, a cada ano que passava, os olhares de alana para mim, não eram de irmã, eram diferentes. Estranhamente, eu gostava. Na verdade, não éramos irmãos, nem adotivos, ela apenas estava sendo criada no mesmo lar do que eu. Isso parecia me confortar, pois, embora ela fosse uma criança ainda, eu gostava do jeito diferente dela gostar de mim.
          Eu completei dezesseis anos e, já iria fazer faculdade. Meu pai me convenceu a fazer Faculdade de Hotelaria. Com muita razão, pois, nesta altura ele já tinha uma rede de vinte e um hotéis em diversas praias famosas do Brasil. Todos funcionando como luxuosos “asilos”, ou, como queira, “casas de repouso”. Em épocas de temporada de veraneios, os parentes aproveitavam as praias e, ao mesmo tempo, visitavam os seus velhos. Era um sucesso absoluto.
          Eu fiz apenas um curso técnico de Hotelaria em Paris, na França. Terminei com dezoito anos. Fiquei dois anos lá. Voltei para casa feliz, pois, eu sentia uma saudade de Alana que doía em mim. Quando cheguei para ficar, Alana chorou tanto, tanto de fazer dó. Algo me incomodava. A saudade que eu sentia de meus pais era diferente da que eu sentia de Alana. A gente se falava todos os dias em vídeo chamada. Eu sempre ligava obedecendo o fuso horário para não atrapalhar o sono e as atividades escolares dela.
Eu retornei ao Brasil e não mais nos desligamos.

          Eu comecei a trabalhar com o meu pai na administração vitoriosa dos Hotéis de Idosos. Era uma moradia cara. Existia quem pagasse. Sempre que não estava em alguma atividade, Alana ia comigo para o escritório. Minha mãe a aconselhava a ir brincar com amigas da idade dela e, ela desconhecia. Alana chamava a minha mãe e o meu pai de tia e tio. Meus pais estavam respeitando um pedido de Alessandra Schneider, mãe falecida de Alana.

          O tempo corria. Alguns meses antes de Alana completar quinze anos, meus pais começaram a programar uma grande festa de debutantes, não só para ela, mas, para todas da região que quisessem participar.

          Assim como o meu avô havia feito, o meu pai passou todos os seus bens para mim e, para Alana. Mesmo antes de começarmos a trabalhar, já éramos multimilionários. Eu trabalhava com vontade junto com os meus pais. Alana não se desgarrava de mim. Como ela era bela, sensível, simpática e carinhosa.

         Enfim, chegou o dia do baile das debutantes. Meninas moças de todo litoral capixaba embelezavam o salão de um badalado clube da região. Primeiro, a valsa das debutantes. Meu pai era um pé de valsa e esnobou com a garota mais bela da festa, Alana. Depois a festa se transformou em um baile comum. Eu dancei com algumas colegas. Enquanto todos se divertiam, eu observei que Alana recusava todos os convites de amigos, para dançar. Fiquei preocupado e, ao voltar para a nossa mesa, notei que ela estava triste.
          __Alana, posso saber por que você não dança?
          __Ninguém me pediu para dançar...
          __Não, não! Eu estou observando você. Muitos amigos tentaram dançar com você e foram recusados. Posso saber por quê?
          __Porque quem eu queria que me convidasse não o fez.
         __Alana, você poderia ter ido até ele e o tirado para dançar, não?
          __Mas, ele não parava de dançar com outras moças. Era um assanhamento só. Não me dava chance.
          __Eu posso saber quem é o felizardo? Enquanto você pensa, dance comigo...
          Sem esperar, Alana se levantou. Eu a peguei pela mão e caminhamos até a pista de dança. Eu senti uma felicidade imensa. Confesso que fiquei em dúvida se podia ou não estar tão feliz assim. Ela parecia flutuar. Ela parecia não estar ali, ou, apenas dentro de mim, ou, eu dentro dela. Parecia que o baile fora feito para mim... parecia que a orquestra tocava para mim. Durante o resto do baile, quase não voltamos para a mesa. Enciumado, meu pai veio até nós e a retirou dos meus braços. Eu cheguei a ficar aliviado. Na minha cabeça eu a via, ainda, dentro daquela caixa de papelão na varanda de nossa mansão do sítio. Eu perguntei a ela se não ia me mostrar o seu pretendido.
          __Vou sim. Fique atento, não me perca de vista, pois, eu vou dar nele um beijo na boca.

          __Eita!!!!!
          Eu senti que a estava amando. Tive medo de vê-la beijando o seu pretendido. Antes da luta eu já me sentia derrotado.

          Quando o baile terminou e, voltávamos para casa, Alana caminhava junto a minha mãe, a caminho do carro. Logo atrás, meu pai elogiava muito a minha dança com Alana, E, o fazia tanto que tive medo de que ele já tivesse notado o meu irresponsável sentimento. Acho que fiquei vermelho. Eu não saberia responder, se ele me questionasse. Mas, não aconteceu.

          Enquanto ele ajudava a minha mãe a colocar as roupas e os presentes no porta-malas do carro, eu ajudei Alana a entrar no banco traseiro e, também entrei. Sozinhos no veículo, eu tentava ajudá-la a ajeitar o seu lindo vestido de debutante quando ela puxou docemente a minha cabeça e me deu um inesquecível beijo na boca. Uma força estranha dentro de mim também a beijou intensamente. Nos largamos abruptamente, quando o meu pai entrou no carro. Tremíamos de medo, ou, de felicidade, não sei. Fomos até à mansão do sítio sem conversarmos.

          Muito romântica, a minha mãe ligou o rádio onde músicas apaixonantes nos incendiava. As nossas mãos se procuravam no escuro do carro. Não conseguíamos nem pensar como seria a nossa convivência dali em diante.

          Chegamos. Meu pai ficou para trás colocando o carro na garagem. Era muito tarde, quase dia. Mamãe deu ordem à governanta que nos preparasse algo para comermos. E, continuou dando ordens...
          __Alana, vá tomar um banho e venha comer alguma coisa. Você também, Enzo, vá se banhar. Vamos comer e dormir antes que o dia amanheça.
          Neste momento, meu pai apareceu com uma garrafa de vinho e me intimou a beber com ele. Novamente eu temi que fosse apenas um pretexto para reprovar o meu comportamento com Alana no baile. Não aconteceu. Ele estava muito feliz e queria apenas comemorar. Ainda bebíamos quando Alana voltou do banho. Eu nunca a tinha observado assim. Descalça, enrolada em uma toalha que realçava as curvas certas de seu corpo divinamente desenhado, cabelos molhados a lhe escorrer pelo ombro desnudo. Ela me lançou um olhar tão provocante e belo que até o meu velho cão, Bowie, se levantou de seu sono preguiçoso e, latiu. Acho que deixei entornar o vinho.
          __Enzo, vá para o banho. Pare com esse vinho. Você também Artur, vá se banhar.
          Comemos e fomos dormir.

          No outro dia nós acordamos muito tarde. Alana ainda estava em seu quarto e, desconfortado, com medo do reencontro, eu saí bem cedo com desculpas de pescar. O calor era intenso. O meu pai gostou da ideia e foi comigo. Meu pai não gostava muito de pescar no rio. Ele havia feito um desvio do rio, próximo à cachoeira, construído uma linda represa onde tinha uma criação do peixe lambari. Ele gostava de pescar lambari, prepará-lo para comer como petisco quando estivesse tomando o seu vinho de todas as noites.

         Estávamos bem distraídos quando Minha mãe e Alana apareceram se banhando na cachoeira. O meu coração disparou. O meu pai me chamou para irmos também nos refrescar. Eu preferi não. Não fui. Parecia que Alana estava muito mais linda do que antes. Um lindo arco-íris se formou nas cristalinas gotinhas espalhadas pela barulhenta cachoeira. Eu tentei, mas não consegui não olhar para ela. Ela e mamãe me chamaram várias vezes, mas, eu não fui.

          Meu pai e minha mãe mergulharam no rio. Alana, com um biquini que nada escondia, correu até onde eu estava e, aproveitando que ninguém observava, abraçou-me pelas costas e balbuciou em meu ouvido...
         __Você não vai conseguir escapar de minha “gostosura” ...
          E, puxando com carinho a minha cabeça deu-me um beijo. Agora um beijo mais demorado e mais gostoso do que o primeiro, no carro. Eu não consegui segurar aquela paixão desenfreada que desconhecia as rédeas de meu raciocínio e a abracei devolvendo aquele beijo que tão bem me fazia, molhando a minha roupa naquele corpo molhado da água da cachoeira.
          __Alana, não faça isso comigo. Eu não posso amar você! Todos acham que somos irmãos. Você ainda é uma criança...
          __Enzo, meu querido, eu amo você, eu sempre amei você... eu quero você! apenas crescemos juntos na mesma casa, mas, não somos irmãos. A sua mãe não é a minha. A minha está nas fotos das paredes de meu quarto. Não existe processo de adoção, somos filhos de pais diferentes, não somos irmãos.
         E, para despistar os meus pais que corriam em nossa direção, Alana me pegou pela mão e corremos em direção ao rio. Eu mergulhei de roupa e tudo. Ela já estava de biquini. Brincamos na água por muito tempo. Tirei a minha bermuda e a minha camisa e as joguei na margem. Sim, é claro, eu estava de short de banho embaixo da bermuda.

         Os meus pais nos avisaram que estavam indo embora. Nós ficamos nos envolvendo em nossa paixão irresponsável. Chegou uma hora em que, eu fiquei com medo da iminente consequência de nossa paixão e, embora querendo ficar com ela no rio, necessitando ficar, eu a deixei me chamando de volta e corri para casa.

          O meu pai ajudava a empregada a fritar grande quantidade de lambari. Para não me arriscar com Alana, eu me ofereci para ajudar., mas, mamãe não deixou e me mandou ir para o banho.   

          Tomei uma gostosa ducha e voltei seguindo o cheiro de lambari frito. Meu pai degustava o seu vinho comendo aquele peixinho gostoso. Ele me ofereceu uma taça e, apesar do questionamento de mamãe, eu aceitei. Mas, eu não queira nada daquilo, eu queria Alana e, sentia que não tinha este direito. Nesta hora ela chega na cozinha irresistivelmente provocante, pés descalços, uma esvoaçante saída de banho que, inutilmente, tentava esconder a beleza daquele corpo mágico. Sentou-se ao lado de mamãe, bem em minha frente. Olhou dentro de meus olhos. Pegou um lambari bem fritinho e, sem desviar o olhar do meu, o colocou em minha boca, deixou que eu mordesse só a metade e, colocou a outra metade na boca dela... Meus pais não punham maldade em nada. Oh! Meu Deus. Resolvi me embriagar. Assustei o meu pai de tantas vezes em que eu enchia e esvaziava a minha taça.

          Almoçamos e eu fui dormir. Dormindo e, perdendo aquela tarde linda, tentando destruir aquele instinto animalesco que eliminava o meu raciocínio, tentando fugir de Alana.
          Eu dormi pouco naquela tarde. Pouco mais de uma hora, eu acho. Acordei com a minha mãe batendo na porta de meu quarto...
          __Enzo! Enzo, eu posso entrar?
          __Sim, mamãe, com prazer. Entre.
          __Você conseguiu dormir? Não faça como o seu pai, tá? Não beba tanto como você fez antes do almoço, ok? Mas, não quero falar disso, nem reprovar você. Eu quero falar sobre você, Enzo e, Alana.
          Nesta hora eu me assustei. Como ela teria descoberto sobre mim e Alana? Será que Alana contara sobre nós? Tentei me defender...
         __Não meu filho, não diga nada agora. Deixe-me falar rapidamente, pois, como vê, o seu pai já está buzinando lá fora me aguardando. Vamos a uma reunião em Vitória, no consulado da Austrália. Empresários australianos estão querendo uma parceria e querem saber sobre a nossa rede de hotéis para idosos.
          __Mas, mamãe, eu e Alana...
          __Você e Alana estavam lindos no baile de debutantes... Você e Alana foram eleitos o casal mais perfeito da festa. Sábado terá um happy hour para a entrega dos presentes das debutantes e, premiação dos dez casais que mais se destacaram. Vocês dois ganharam em primeiro lugar!
          __Verdade, mamãe? Que legal. Alana estava realmente linda e, como ela dança bem! Ela merece o prêmio...
          __E, tem mais, meu filho. Vocês estavam muito lindos nadando no rio hoje pela manhã. Eu e o seu pai nos orgulhamos muito de vocês dois.
          __Obrigado, mamãe. Eu e Alana amamos muito vocês. Levem-na com vocês para o encontro no consulado. Ela vai gostar.
          __Como assim? Ela está se arranjando dizendo que você a convidou para ver um filme em São Mateus!? E é melhor você se apressar, pois, ela já está quase pronta.
          Eu fiquei sem palavras. Eu não iria segurar aquele amor por muito tempo. Alana estava apertando o cerco... e, eu gostava muito, mas, sentia que não poderia fazer isso, ela era uma criança ainda.
          __Até mais, meu filho. Apreciem bastante a noite...
          __Até mais mamãe.
          Eu não concordava comigo mesmo. Eu necessitava ficar sozinho com Alana, eu estava irresponsavelmente apaixonado. Eu entendi, agora, porque, desde que ela era bebezinha, eu adorava brincar com ela e, ela ficava feliz com a minha presença. Ela me olhava diferente. Um diferente que eu adorava olhar. Não tenho dúvida, eu a amo perdidamente. Ela também tem demonstrado que me ama, porém, de uma forma inocente e perigosa. Nós sempre nos abraçamos, desde sempre, gostosamente diferente. Muito recentemente é que este amor explodiu e, nos beijamos. Nos beijamos três vezes, eu acho. Mas, a cada beijo, mais nos sentimos desejosos de algo mais. Eu quero isso, meu amor por ela quer isso, meu corpo quer isso, mas, sei que meus pais não vão entender, a sociedade não vai entender. Ao mesmo tempo eu sentia não conseguir me controlar. Eu não podia ficar sozinho com ela. Eu não podia ir ao cinema com ela, pois, eu sentia que ela não queria ver filme nenhum. Resolvi então sair sem ela me ver, ir passear em algum lugar e, voltar apenas muito tarde da noite quando ela já estivesse dormindo.
          É isso mesmo. Eu me banhei e me troquei rapidamente. Estava calor. Vesti uma bermuda linda, uma camisa bem fresquinha e o meu mais bonito tênis. Usei o meu mais fino perfume que eu trouxera de Paris quando lá estudava. Saí furtivamente em direção à garagem. Sempre tentando não ser visto.

          Assim que eu abri a porta da garagem, que surpresa! Uma surpresa que, deveria ser ruim, mas, me fez de uma felicidade sem tamanho...   e,como fez!  

          Alana estava dentro do carro me aguardando. Ela era mais inteligente e mais decidida do que eu. Mas, fiquei feliz. Sim, fiquei feliz, pois, era ali mesmo que eu a queria, embora não devesse. Por ser mais velho, por ser adulto cinco anos mais velho, por ela ainda ser uma criança de quinze anos, eu deveria conversar sadiamente com ela e lhe mostrar que aquele era um sentimento que não poderíamos sustentar.

          Eu me acomodei ao volante e, tentei falar, mas, eu tive a minha fala interrompida pelo mais ardente beijo de amor. Eu, apaixonadamente, entreguei-me àquele beijo. Acho que tínhamos a mesma incerteza da possibilidade daquele amor, pois, por um instante ficamos abraçados sem nos olharmos. Quando nós nos olhamos, estávamos chorando, silenciosamente. Fomos surpreendidos pela governanta que entrou na garagem...
          __Perdão, meus queridos, eu vim ver por que a garagem estava aberta. Você, Enzo, costuma deixá-la aberta quando sai e o seu pai não gosta, você sabe disso.
          Eu saí do carro, meio sem saber o que dizer. Certamente eu estava vermelho. Tive medo de falar e a minha voz me condenar. Ela nos viu beijando. Tentei qualquer desculpa e a minha voz não saia. Ela me viu nascer, me tratava como filho. Eu tive medo, vergonha e, tremia. Não consegui falar e a abracei fortemente. Alana também saiu do carro e, se juntou ao nosso abraço. Por algum tempo, ficamos abraçados chorando sem saber o que dizer.
         __Dona Nanci, perdão. Acho que não é o que você está pensando...
         __Como assim? Você acha que eu não sei diferenciar um beijo de amor de outros beijos apenas de desejo sexual? Enzo e Alana. Eu sei ser muito discreta. Eu sempre observei vocês dois. Sempre soube que o “gostar” entre vocês dois era diferente. Eu sempre soube que vocês se amam. Acho até que demorou a acontecer. Agora que se declararam, cada minuto a sós será mais gostoso. Eu acho que vocês não podem ter medo de se amarem. Eu não consigo enxergar cada um de vocês amando pessoas diferentes. Mas, entendam, Sr. Artur e Dona Alice têm que saber disso. Vocês dois vão chamá-los amanhã, ou talvez hoje mesmo quando voltarem do consulado, os dois juntos vão confessar tudo isso. Não vai ser difícil. O amor sincero está estampado em seus olhos. Se disserem que são irmãos, mostrem as suas identidades. Não têm os mesmos pais. Não têm o memo sobrenome, aliás eu sempre torço a língua ao tentar pronunciar o sobrenome de Alana, “S-C-H-N-E-I-D-E-R. Alana sempre chamou Dona Alice de tia e, Sr. Artur de tio.
          __Não sabemos o que dizer, Dona Nanci.
          __Também, não existe nenhum documento de adoção. Vocês protagonizam a mais linda história de amor que eu já pude ver. Nem “Romeu e Julieta” foram mais lindos. Vão se divertir, mas, não se exponham à opinião pública antes de seu pai e a sua mãe, Enzo, saberem. Sejam discretos. Depois que conversarem sadiamente com Sr. Artur e Dona Alice, eles, não pensem o contrário, demorarão a assimilar esta ideia. Eles vêm vocês como irmãos. Ela sempre se aconselha comigo e eu vou convencê-los de que, nenhum preconceito familiar, religioso ou social vai conseguir separar este amor. Não é apenas um amor de dois jovens lindos, saudáveis, atraentes, com os hormônios aflorando pela pele almejando uma transa. É o amor que eu testemunhei em em seus olhinhos desde quando eram criancinhas. O amor que eu vi doer em Alana quando você estava estudando em Paris, Enzo.
          __Obrigado, Dona Nanci.
          __Vão se divertir. Sejam discretos. Não permitam que ninguém os vejam se beijando, como me permitiram. Podem se beijar e beijar muito, mas, por favor, não passem disso. Eu vou convencer os meus patrões. Vou até sugerir que sábado, na festa dos presentes e condecorações de debutantes e premiados, o Sr. Artur, como presidente
do clube, anuncie e explique a razão de vocês poderem se amar. Agora vão se divertir.

          Eu dei ré lentamente no carro, manobrei em direção à saída. Sorrindo, Dona Nanci nos acenava. Parecia feliz. Pena que ela não pudesse decidir, sozinha, o nosso destino. Antes de chegarmos na autoestrada da Rodovia do Sol, ainda no sítio, na curva do caminho eu perguntei a Alana qual filme ela queria ver.

          __Que história é essa de filme, Enzo?

          __A minha mãe me acordou dizendo que você dissera a ela que eu a havia convidado para ver um filme, mas, eu não convidei você para ver filme nenhum.

          E, beijando aminha mão que estava firme no volante...

          __Ah! Sim. O meu filme é você Enzo. Eu quero estar perto, eu sinto você no filme de minha vida, eu amo você. Beija-me forte, beija-me com paixão, faça-me esquecer de mim e sumir dento de você!

          Instintivamente, nós saímos do carro e nos abraçamos fortemente naquele escuro sem testemunhas. Nos beijamos muito, mas, conseguimos frear as nossas irresponsabilidades e voltamos para o carro. Eu não quis ficar sozinho com ela. Ao som de belas músicas no carro, nos dirigimos até Guarapari. A noite estava linda. A Praia do morro estava que não cabia mais ninguém. Estacionar era impossível. Procurei a garagem de um dos Hotéis de Idosos de meu pai.  Deixamos os calçados no carro e caminhamos a pé, longas distâncias, pela Praia. A água aquecida do mar vinha beijar os nossos pés, docemente. Nós nos sentamos em uma mesa de um casal conhecido. Conversamos até muito tarde. Bebemos água de coco. Eu não podia ingerir bebida alcóolica, pois, tinha que dirigir dois veículos, o meu carro e o meu corpo sedento de amor.

          Chegamos em casa bem tarde. Nanci nos esperava.

          __Boa noite, Nanci. Meus pais já voltaram?

          __Sim. Eles vieram apenas pegar documentos e roupas e voltaram. O encontro com empresários foi um convite para investir no mesmo tipo de Hotéis para Idosos, na Austrália. Você sabe, seu pai respira dinheiro. Neste momento estão voando no jatinho particular dele para o outro lado do Oceano Pacífico. Eu já intimei Dona Alice a ter uma conversa com vocês dois sobre o comportamento de vocês. Depois que se aprontaram, se despediram e, já no carro, Dona Alicie me chamou e falou, com lágrimas de emoção, que vocês dois se amam.

        __E o que você disse?

        __Acho que teria muito a dizer, mas, ela não esperou e partiu.

 

          Depois Dona Alice nos ordenou que nos banhássemos e voltássemos para cozinha para comer algo.

          Eu voltei primeiro, já de pijama. Alana chegou a seguir. O seu perfume era o que eu mais gostava. O seu “pijaminha” de calor, mal conseguia escondê-la de mim. Sempre olhando dentro de meus olhos, ela se sentou ao meu lado, cruzou as lindas pernas deixando mais à mostra ainda, nádegas fantasticamente esculpidas.

Nanci não perdoou.

          __Alana!!!!!! Hoje, acho que vou fechar a porta de seus quartos  por fora.

          Comemos e fomos dormir. Dona Nanci cumpriu o que prometera. Fechou as portas de nossos quartos por fora.

          No outro dia, nós, como sempre, acordamos cedo, nos aprontamos e eu fui levá-la para o colégio. Eu abri a porta do carro para ela entrar. Antes de entrar ela beliscou o meu bumbum. Dona Nanci deu risada.

          __Você, dormiu bem, “irmãzinha”?

          __Pare o carro!

          __O que foi?

          __Pare o carro! Já disse!

Eu obedeci e parei o carro. Ela me agarrou até raivosamente, me beijou loucamente na boca, completando...

          __Eu não sou sua “irmãzinha”.

          Eu não sabia como me comportar, embora o meu corpo soubesse. Fiz o que tinha de ser feito. Deixei-a, como sempre, na calçada do Colégio. Senti que ela saiu sem olhar para trás. Votei para o escritório.

          O tempo demorou muito a passar. Voltei ao final das aulas, à tarde, para buscá-la. O porteiro me avisou que ela não fora à aula.

          __Como assim? Eu a trouxe para a escola hoje cedo, como sempre faço. Posso saber lá dentro? Com os colegas dela?

          __Sim, claro, mas, tenho certeza. Ela não entrou no colégio.

          Depois de conversar insistentemente com colegas de classe, colegas do colégio, professores, o desespero caiu em mim como uma bomba. Alana havia desaparecido. Eu corri para a polícia. Não quiseram nem registrar o caso alegando que a maioria dos desaparecimentos se resolvem sozinhos nas primeiras vinte quatro horas. Saí de lá com sentimento de revolta e tristeza.

Voltei para o sítio e, quando lá cheguei, encontrei Nanci desesperada e, chorando, me entregou uma carta que um motoqueiro, com a moto sem placa, havia deixado com ela.

Na carta, muito mal escrita, eles exigiam...

“ESTAMOS COM A GAROTA. QUEREMOS UM MILHÃO DE DÓLARES PARA DEVOLVÊ-LA... SEM POLÍCIA OU A MATAREMOS. AGUARDEM NOVO CONTATO”.

Imediatamente eu liguei para o meu pai. Eles ficaram desesperados e disseram que eu pagasse o resgate sim. Estariam voando de volta agora. Mas, não deixasse de ir à polícia, até pelo descaso inicial.

          Quando cheguei na delegacia antissequestros, imediatamente foi aberto um boletim de ocorrências. O envelope e a carta foram analisados por papiloscopista. As únicas digitais eram de Nanci e minhas, o que significa que os sequestradores (ou sequestrador) usaram luvas para escrever a carta. Um esquema de escuta foi instalado e várias diligências e interrogatórios iniciadas.

          Dois dias já se passaram e novo contato não acontecia. A minha mãe, quase morria de dor e angústia. Nós tínhamos aquele dinheiro. Bastaria um novo contato e, tudo estaria resolvido. Uma semana e, nada. Novas pistas a polícia não as tinham. Um policial parecia sempre querer me convencer a pagar logo o regate e, acabar com o sofrimento, mas, a quem? Não havia um novo contato. Comecei a me culpar por ter ido à polícia. Na carta ameaçavam matá-la se o fizéssemos.

          Meu pai contratou um escritório de advocacia e de detetives particulares, famosos na região. Eles começaram a levantaar todos os detalhes e ocorrências na região desde dois dias antes do desaparecimento de Alana.

          A minha mãe entrou em um estado de angústia tão grande que teve que ser internada em um hospital de Vitória.

          Quase dois meses e o novo contato não acontecia.  E, nem aconteceria...

          Enquanto aguardávamos, quase dois meses antes, um carro com um casal levava Alana amarrada e amordaçada em um banco de trás de um carro em direção ao Paraguai, de onde pretendiam continuar as negociações. Era um policial já reformado e a sua esposa. Acontece que ela não concordava e não queria aquilo, mas, foi forçada. Durante todo o percurso o casal discutia e brigava muito. Alana conseguiu se livrar da mordaça e começou a gritar por socorro. O policial lhe deu uma coronhada violenta e ela desmaiou. Aí então é que a briga do casal se agravou. Na divisa do Brasil com Paraguai, eles abandonaram o carro e roubaram outro com Placa do Paraguai. Já estavam em uma cidade do País vizinho, quando o policial irritado com a esposa começou a agredi-la fisicamente. Moralmente já vinha fazendo há muito. A esposa tentou impedir de levar uma coronhada e, lutando com o seu marido, a arma disparou o matando na hora. Era muito tarde. Ela ficou desesperada. Não sabia o que fazer. Ela também participara do sequestro e, certamente também seria responsabilizada. Principalmente depois da morte do marido. Ela era sequestradora e assassina, agora. Por sorte, ninguém ouviu ou deu importância ao tiro. Por muito tempo ela ficou ali parada, desesperada sem saber o que fazer. Logo ela observou que do outro lado da rua tinha um convento. Depois de muita hesitação ela pegou Alana com dificuldade, desmaiada, e a colocou na entrada do Convento na esperança de que ela fosse encontrada. Pegou um bom dinheiro que o seu marido havia levado e, já trocado por Guarani para passarem, não se sabia quantos dias, até receberem o resgate. Pegou também os cartões dele e dela, levou o carro para uma estrada deserta, colocou fogo no carro para apagar as impressões digitais e fugiu. Só ficamos sabendo disso muitos dias depois do caso resolvido, quando ela, sem risco de ser presa, telefonou para meu pai e contou toda esta história. Isto muitos dias depois do caso resolvido.

          Antes de sabermos este quadro os detetives contratados, começaram a considerar todas as ocorrências, desde dois dias antes do sequestro. Na moto sem placa que fora usada para levar a carta para o sítio, que era roubada, fora identificado uma impressão digital. Um carro roubado ali na cidade e, que foi encontrado na divisa com o Paraguai, tinha impressões digitais da mesma pessoa. As duas digitais coletadas coincidiam com o DNA do corpo encontrado carbonizado no carro em uma estrada vicinal no Paraguai.  Eram de um policial reformado, que trabalhara naquela delegacia e, por coincidência, pai do policial que vivia me instigando a pagar o resgate para “acabar” com o sofrimento. Não tinha dúvidas. Eu fiz uma denúncia formal do policial. Apesar das evidências eu não tinha provas e, nada poderia ser feito. O caso ganhou repercussão internacional. Jornais do mundo inteiro estamparam a minha foto e a do policial na primeira página.

          Algumas horas após o amanhecer, quando os jornais começaram a circular, eu recebi um telefonema de uma freira que se dizia Madre Superiora, falando de uma garota que fora encontrada na porta do seu Convento, no Paraguai, há quase dois meses. Eu perguntei como ela era. A Madre não quis dizer. Inverteu as perguntas querendo saber as características da garota. Eu falei corretamente. Mesmo assim ela quis mais. Perguntou se ela tinha algum sinal característico. Eu respondi que ela tinha na face interna do braço esquerdo uma tatuagem do rosto de uma mulher muito bonita, que era da mãe dela falecida e, estava escrito em torno da tatuagem “AMOR DA MINHA VIDA”.

          __Você acaba de encontrá-la.

          O telefone estava em viva voz e todos vibraram. Eu não consegui mais falar, cai num choro desesperador, não sei se de pena de Alana ter passado por tudo isso, de felicidade ou de uma paixão que ameaçava “enforcar” o meu coração. O meu pai pegou o telefone e continuou a conversa. A Madre continuou...

          __Há quase dois meses, pela manhã, encontramos essa moça desmaiada na porta do convento. Chamamos o médico que nos assiste e ele acompanha o tratamento dela aqui mesmo. Ela despertou logo, mas, nunca havia falado, sempre ficava rezando na capela, quando tentávamos descobrir alguma coisa ela apenas chorava. Não respondia perguntas, nem faladas nem escritas. Ela ajudava muito na limpeza, na cozinha, nas obras de caridade, mas nunca falou. Rezava e chorava muito.

          __Só hoje ela falou? Como foi?

          __Ela sempre pegava os jornais na caixa de correios do Convento.

          __Então?

          __Hoje, quando ela foi pegar os jornais, ela começou a chorar alto em quase desespero. Nós corremos até ela para ver o que estava acontecendo. Pela primeira vez, em quase dois meses, ela falou. Gritava desesperada apontando para uma foto no jornal. Quando perguntamos quem eram aqueles, ela chorava tanto que quase não conseguia falar. Depois de muito tempo, já tendo tomado um calmante dado pelo nosso médico é que ela falou. Disse o nome de Enzo, não disse o que era dela e, do policial ela disse chorando desesperada que era quem a pegou na entrada do Colégio. Também disse que se chama Alana. Venham logo buscá-la, pois, ela está sofrendo muito.

          Imediatamente corremos para a Delegacia. Colocamos o Delegado em contato com a Madre Superiora e, tudo foi confirmado. Imediatamente foi dado voz de prisão para o policial suspeito.

          No Jatinho de meu pai, voaram para o Paraguai, a Nanci, meu pai, nosso Advogado e o Delegado. Mamãe estava muito debilitada, embora ao ouvir a história já sorriu e pediu comida. Eu não quis ir. Eu me desculpei dizendo que ficaria com a minha mãe e que a Nanci fosse. Eu não saberia reagir na frente de meu pai quando a visse.

Segundo relatos foi um encontro muito forte, de cortar o coração. Ambos choraram. Até mesmo o Delegado, acostumado a tantas desgraças. Alana, segundo o meu pai, abraçou e agradeceu a uma por uma das Irmãs de Caridade. O meu pai prometeu levá-la ao convento sempre que quisesse para matar as saudades. Como o meu pai sabia que conventos vivem de doações, ele fez um cheque no mesmo valor que os sequestradores haviam pedido. A Madre quase desmaiou quando viu “um milhão de dólares”.

Despediram-se e foram para o jatinho.

          Em casa, no sítio, aquele resto de tarde e noite foi só de festa. Mas nem tudo estava acabado.

 

           Ainda no Aeroporto, o Delegado recebera um telefonema informando que, o policial preso se enforcara e morrera carbonizado.

          Já na delegacia, o delegado questionou o Diretor do Presídio. Como poderia uma pessoa se enforcar e colocar fogo no próprio corpo.  No mesmo dia um preso havia fugido sem deixar pistas e, um agente penitenciário havia desaparecido. O agente não atendia telefone e, em sua residência, vizinhos disseram que ele havia se mudado, não sabiam para onde. Após severa investigação e diversos depoimentos, um presidiário revelou que no dia um agente saíra com um detento do pátio e ninguém mais o viu. Mostrando as fotos dos agentes, o mesmo presidiário conheceu o agente que buscara o detento no pátio. Era exatamente o que estava desaparecido. Autorizada uma exumação do corpo do policial morto, em dados laboratoriais, descobriu-se que aquele corpo não era do policial e, sim, do detento supostamente fugitivo. O policial estava vivo e solto.

          O delegado avisou a Artur que eles estavam correndo risco e, seria bom se ausentassem um pouco da cidade. O policial e o agente desaparecido, certamente iriam se vingar da frustração.

          Artur pediu a Enzo que fosse para um hotel fazenda com Alana. Deu alguns dias de dispensa para Nanci para ela não correr risco no sítio. Novamente internou Alice para acelerar a recuperação dela e, aos empregados do sítio, pediu que ficassem atentos e não se arriscassem.

          Imediatamente Enzo e Alana foram para um confortável Hotel Fazenda. Nanci estava junto. Enzo não quis se arriscar sozinho com ela. Nem ele nem Alana saberia se proteger.

          Chegaram cansados no Hotel Fazenda. Banharam-se e desceram para jantar. Antes decidiram se relaxarem no bar do Hotel para depois deliciarem aquela cheirosa comida rural. Alana pediu um suco de laranja, Nanci uma cerveja e, eu, um vinho.

          Depois do jantar, resolvemos passear e conhecer as atrações do Hotel. Passeamos por um longo tempo. Depois paramos próximo à piscina. Tudo era muito bonito. Era um Hotel fantástico. Era uma estrutura para se descansar realmente.

          __A noite está muito quente. Olha que piscina convidativa. Enzo e Alana, por que não nadam um pouco?

          __Não. Acho melhor não.  O que acha Alana?

          __Por que não, Enzo. Vamos nadar sim. Não tem ninguém na piscina, vamos também, Nanci?

          __Vão vocês. Eu vou continuar aqui no jardim apreciando a beleza do lugar.

          Então, subimos para os nossos quartos para nos trocarmos. Saímos quase juntos no corredor do Hotel. Um bonito roupão toalha escondia bem o corpo de alana. Eu já desci de short e apenas uma toalha nos braços. Quando chegamos na piscina, sem demora, Alana já quis mostrar a sua classe nas águas. Mergulhou lindamente e desapareceu por uns instantes. Emergiu do outro lado da piscina. Insistiu que eu entrasse na água. Sentado na borda da piscina eu estava e continuei. Novamente Alana mergulhou desaparecendo por uns instantes e, surgiu à minha frente puxando os meus pés. Eu acabei caindo na água já direto nos braços dela. Mergulhamos agarradinhos. Já dois meses sem um abraço, sem um beijo. Emergimos juntos e não mais nos desgarramos. Nanci nos observava. Ela queria nos vendo livres para amar, tanto quanto nós. Então nos beijamos muito. Nanci já não estava lá. Repentinamente, alguém sentido o clima de amor, ligou o som da piscina. Apaixonantes melodias nos intimavam a amar. Alana puxou-me pela mão para fora da piscina. Nos abraçamos carinhosamente e começamos a dançar. Dançamos um bom tempo. Paramos de dançar e nos envolvemos em longos e repetidos beijos. Ninguém nos olhava. Apenas a lua cheia, por detrás dos montes azuis, nos observava, mais parecendo uma lanterna de país de gigantes querendo iluminar a nossa paixão. Alana se cansou.

          __Eu vou dormir, Enzo.

          __Você está bem, Alana?

          __Sim. Vamos dormir? Não vou assediar você...

          __KKKKK... É por isso que não vou.

          __Então vamos comigo. Assim eu mudo de ideia e...

          __Alana, eu vou beber mais um pouco. Não quer comer alguma coisa?

          __Não agora. Eu vou me banhar e talvez eu peça do quarto mais tarde. Não se embriague, OK°

          Alana subiu e eu fui para o bar do Hotel.  Pedi uma dose dupla de uísque. Inicialmente eu não queria beber, apenas despistei para fugir do risco de estar a sós com o amor da minha vida. Depois eu mudei de ideia. Eu tinha que ficar bem embriagado para conseguir desconhecê-la.

          Nesta hora o meu pai me ligou dizendo que o problema já estava resolvido. O policial junto com o agente penitenciário, mais dois comparsas invadiram o sítio. Só que eles não esperavam que a polícia os esperava. Houve troca de tiros e todos faleceram. Ele me pediu para não dizer nada a Alana.  Como eu estava bêbado e não podia dirigir assim, eu fui dormir. Saímos bem cedo no outro dia.

          Mamãe estava ótima. O seu remédio fora o resgate de Alana.

          No Sábado seguinte aconteceu a festa de premiação de Debutantes e vitoriosos do baile. Foi muito bonito. Eram muitas garotas e ficamos muito cansados. Voltamos para a casa. Uma gostosa janta nos esperava. Mamãe nos mandou para o banho. Meu pai disse que não queria jantar. Queria apenas os lambaris e o vinho. Eu tomei banho rapidamente, e voltei para a cozinha. Eu, Alana, mamãe e Nanci jantamos. Todos fomos para cama.

          Eu não consegui dormir bem. Tive o sono sobressaltado por pesadelos reais. Em meu sonho eu me perguntava o que eu estava fazendo com uma criança de quinze anos. Por mais que nos amássemos desde crianças, Alana continuava uma criança. Eu sentia que não tinha este direito, mas, o meu coração não me obedecia. Quando eu parecia querer dormir sem remorso, eu fui acordado por Alana, ainda de madrugada.      

          __Enzo, Enzo, acorda. Vamos nadar no rio?

          __Você está louca, Alana. Ainda está escuro, ainda é muito cedo.

          __Não Enzo. Está muito calor. A água do rio deve estar uma delícia, vamos, acorde. Não vai me deixar correndo risco no rio sozinha, vai?

          __Você é mesmo, danadinha, minha irmã...

          __Não me chame de sua irmã. Levanta-se desta cama e vamos nadar.

          Eu sentia que era uma boa ideia. Mas, ao mesmo tempo eu temia pela minha fraqueza, ou, pela força da minha paixão. Ela estava com um lindo biquini.  O seu corpo lindo me empurrava para o descontrole de meus desejos.  Eu necessitava colocar o short. Pedi a ela para sair, ou se virar. Ela, ao contrário veio me ajudar a tirar o pijama e vestir o short. Eu pedi novamente e, ao contrário ela começou a se esfregar em meu corpo nu.

          __Alana, não faça isso comigo. Vou gritar a mamãe.

          __Por que eu não devo? Afinal. tudo isso vai ser meu. Ou não?

          __Deste jeito eu não sobrevivo. Morro antes.

          __Ah! Não. Deus não vai fazer isso comigo. Vamos logo. Eu quero chegar antes dos pássaros despertarem a aurora.

          __Alana, eu estou vivendo uma crise de remorso. Eu amo você, mas, sinto que não posso usar deste amor para desfrutar de uma criança de quinze anos. Vamos dar tempo ao tempo.

          __Tudo bem, Enzo. Me desculpe. Vamos continuar camuflando o nosso amor até eu atingir a maioridade. Mas, isto não nos impede de nadarmos. Vamos.

__E, não vamos comer nada?

__Você quer comer? Que tal eu?

__KKKKK... Já sei. Eu não vou conseguir escapar da sua “gostosura”

           Novamente Alana venceu. Saímos sem fazer barulho, passamos na cozinha e cada um pegou uma maçã e fomos comendo em direção ao rio. Realmente ainda estava muito escuro. A lua estava linda. Fomos em direção à cachoeira. Alana me abraçou e, nos beijamos docemente. Eu a peguei no colo e a deitei na grama fofa. Muitos carinhos, afagos e beijos apaixonantes que culminaram em uma delicada e demorada transa que, de tão gostosa eu jamais imaginaria. Alguns minutos de descanso e o amor voltou a acontecer. Desta feita, mais lentamente, mais delicadamente, pois, o amor estava acima do sexo. Exaustos rolamos para os lados e ficamos juntinhos. Nesta hora incontáveis dezenas de pássaros, deixaram os seus postos onde cantavam saudando o novo dia e, revoaram em ritmados e lindos malabarismos entre nós e o céu que começava a clarear acima de nós. Parecia um convite para a bela vida que se mostrava. Parecia um convite para a necessidade de aprender a não mais adiar os desejos. Nos beijamos intensamente, pegamos as nossas roupas de banho e mergulhamos no rio. Já dentro d’água é que nos vestimos. Nadamos muito, fizemos planos, demos muitas risadas e ficamos muito felizes de nos pertencermos.

          __Alana, e se você se engravidar?

          __Não se preocupe, eu não vou ficar grávida.

          __Como você sabe? Como pode ter certeza?

          __Nanci, sentindo que a cada dia a nossa paixão saía do controle, me deu e me ensinou a tomar anticoncepcional.

          Mais dona de si do que antes, ela voltou a me beijar. Voltamos para a margem e transamos novamente. A cada transa, eu me apaixonava mais por aquela guriazinha gaúcha. Voltamos a mergulhar e nadamos até nos cansarmos. O sol já incomodava bastante. Saímos do rio e ficamos na cachoeira.

          Nanci apareceu, nos alertando que nos viu sair de madrugada e, que já passava do meio-dia.

          __Vocês devem estar famintos. Vocês comeram alguma coisa?

          __KKKKKK... eu comi uma maçã e, Enzo, comeu duas.

          __Não, Nanci. Eu comi apenas uma maçã, estou com fome sim.

          __Não minta Enzo, você comeu duas maçãs sim...

          E, puxando-me pelo braço, saímos correndo para casa.

          __É Alana. Eu estava certa quando lhe ensinei e lhe dei o anticoncepcional.

          Chegamos em casa e fomos direto para o banho. Mamãe e papai estavam na sala de jantar. Pareciam felizes. Como sempre papai bebia o seu vinho. Alana estava muito alegre. Alegre até demais. Eu fiquei com medo do que ela pudesse revelar. Achei melhor tomar um vinho junto com o meu pai. O que faria se ela contasse tudo, não sei. E ela começou a falar...

          __Pessoal, hoje é o dia mais importante de minha vida. O que me aconteceu hoje...

          Nesta hora eu entornei vinho na toalha da mamãe, Nanci queimou a mão no forno do assado e, até o meu cão velho, Bowie, levantou a cabeça e voltou a dormir enquanto Alana continuava.

          __Tudo, pessoal, começou com um gostoso banho de rio pela manhã. Gastamos muita energia brincando no rio e na cachoeira. Estamos famintos.

          Enquanto falava, Alana me abraçou gostosamente pelas costas e, depois, me puxou pela mão e me levou ao banheiro dela para ver o que a minha mãe havia escrito no espelho. Eu tentava ler e ela me dava o maior “amaço”, beijava o meu pescoço e me abraçava forte pelas costas.

          __Pare Alana, eu quero ler e você não deixa...

          __Está bom. Então leia.

“ALANA MINHA QUERIDA, OBRIGADA POR TER SOBREVIVIDO AO SEQUESTRO. BEM-VINDA DE VOLTA À VIDA... SEJA MUITO FELIZ... AME A SUA FELICIDADE... FAÇA A SUA FELICIDADE SER AMADA... AME O AMANTE DE SUA FELICIDADE... A FELICIDADE É UM ANJO VAGABUNDO E NÃO GOSTA MUITO DE ESPERAR ... NÃO ADIE OS ECONTROS... AME AINDA HOJE... NÃO DEIXE PARA DAQUI A POUCO...

          Depois Alana me beijou demoradamente na boca e, voltamos para a sala. Ela chegou na sala abraçando e beijando a minha mãe tantas repetidas vezes. Confesso que fiquei com ciúmes.

          __Mamãe, que lindo. Você poetiza tudo que escreve. Esta mensagem pode ter mais de uma interpretação. Alana deve agradecer pela felicidade que vai buscar, ou, pela felicidade que desfrutou hoje?

         Nesta hora, Alana me deu um forte beliscão no bumbum me forçando a dar um grito e pular para frente. Bowie, o meu cão velho, latiu fraco e saiu da sala. Nanci novamente se queimou na cozinha...

          __Alana e Enzo, eu não estou entendo vocês.

          __Nada não, nada não. Enzo está fragilizado, pois, não queria e, eu o obriguei a comer duas maçãs...

          __Ajude-me Nanci. Não consigo entender nada.

          __Não se canse, patroa. Alana e Enzo tomaram sol quente na cabeça durante toda a manhã. Agora chega de papo e vamos almoçar...

          Mamãe sempre gostou muito de música e, até durante as refeições, músicas suaves eram ouvidas. Sem nada entenderem daquela conduta, Alana me puxou da mesa onde eu já começara a almoçar e, emocionada me convidou a dançar. Embora eu dissesse que não era a hora, dançando comigo, o que eu temia aconteceu. Deslizando lindamente em torno da sala de jantar, Alana abraçava-me carinhosamente. Chorava. Chorava silenciosamente. Sem saber bem por que, todos deixaram os garfos e facas e, sem conseguirem evitar, seus olhos se encharcaram. Sim, se encharcaram durante a “oração” de Alana, que, a cada momento, mais se empolgava me conduzindo naquela dança mágica... Alana era apenas uma criança. Uma criança que se aproveitava da minha fraqueza e me seduzia. Parecia que alguém sobrenatural falava por ela. Ela não tinha como fazer aquela oração, sozinha. Seria a mãe dela? Não, eu não consigo acreditar em vida pós morte. Ou Alana era mais inteligente e sabia que em uma simples conversação, Artur e Alice talvez não se convencessem da sua necessidade de amar. E, lindamente me levando em uma dança mensageira e bela, Amanda não gaguejou em sua prece...

          __Meu Deus! Deus de todos os Deuses! O Senhor, meu Deus, tirou a minha mãezinha antes dela me conhecer bem. O Senhor, meu Deus, a levou antes que eu a pudesse amar. Eu, Senhor Deus, ainda consigo recordar, quando eu estava no útero, dos batimentos cardíacos dela e da alimentação que a sua placenta me fornecia, via sanguínea. Fisiologicamente e emocionalmente, eu e ela nos conhecemos apenas até eu ser expulsa de seu aconchegante útero. No entanto, meu Deus, para compensar, o Senhor me deu a graça de jamais aceitar outra como minha mãe.  Mas, agradeço, Senhor meu Deus, por ter me “jogado”, há pouco mais de quinze anos, nos bracinhos do Enzo. Desde os primeiros minutos em que nos olhamos, nós nos amamos. Há pouco mais de quinze anos eu sou a criatura mais feliz do mundo. Naquele dia, meu Deus, você tirou do meu peito o meu coração e o colocou no peito de Enzo. O meu coração nunca mais quis sair de lá... está abraçadinho com o coração dele. Meu Deus, não deixe que ninguém tente tirar o meu coraçãozinho do peito de Enzo. Preconceitos familiares, preconceitos religiosos, preconceitos legislativos e sociais podem sufocar a minha felicidade e matá-la em meus, ainda, pouco mais de quinze anos...

          Mesmo sem parar de dançar, cada vez mais artisticamente, indiferente ao clima de emoção que esfriava aquele almoço, Alana continuou a sua “oração”.

          __Por favor, Deus de todos os mundos, grite em todos os ouvidos que o meu amor não deve ser legislado. Eu não posso ficar sem Enzo. Eu amo Enzo, eu quero Enzo, eu não sou eu sem Enzo, eu necessito me casar com Enzo!

          E, soluçando baixinho, Alana parou de dançar. Descansou a sua cabecinha em meu ombro já molhado pelas suas lágrimas. Aquela “oração”, de uma criança ainda, mas, cheia de verdade, pareceu nos tirar do meio de todos. Nada mais existia em meu entorno. Sentíamos um só corpo isolado no meio do nada e, o nada era tudo que necessitávamos.

          __Enzo, meu amor, abrace-me forte. Abrace-me com a paixão que eu quero ter, faça-me esquecer de mim e só amar você. Conduza-me por um caminho do qual eu não queira retornar.

          E, nos beijamos longamente. As pessoas na mesa de jantar eram apenas um detalhe. Embora estivéssemos, nós não estávamos ali. Flutuávamos na abençoada magia de um sonho lindo. Eu, desde pouco mais de quinze anos atrás, sonho o sonho que ela sonha. Na adolescência, o nosso sonho explodiu como um sentimento encantador. Um encanto que mais abrilhanta o arco-íris da cachoeira, um encanto que faz mais bela a lua grande que tem que fugir na alvorada, que multiplica o balé de pássaros e das coloridas borboletas esvoaçantes da margem de nosso rio de águas claras, um encanto que transforma os nossos corações em um só coração.

          O almoço de todos esfriava. A fome daquele almoço esfriava na mesa. O bilionário dinheiro de meu pai não sabia como comprar uma autorização para   “irmãos” se amarem, mesmo sabendo que eles não eram irmãos.  Duas crianças de famílias diferentes se condenam ao sofrimento pelo simples fato de crescerem juntos e, formando uma “mesma família”.  Em um pranto incontrolável, a minha mãe disse ao meu pai:

          __Artur, meu marido, diga alguma coisa, meu amor.

          _­_Eu não sei o que dizer. Eu não sei lidar com essa situação. Tenho medo de tudo. Eu tenho medo de impedir que se amem, eu tenho medo da constituição federal, da sociedade, das religiões...

          __Mas, papai, nós...

          __Não, meu filho, eu e, a sua mãe somos responsáveis pela felicidade de vocês dois. Foi o almoço mais gostoso de minha vida, embora eu não tenha conseguido comer. As palavras de Alana, interrompendo o nosso almoço, ecoaram como um pedido de socorro em forma de “oração”. Nenhum Juiz, nenhum promotor conseguiria derrubar a sua empolgante defesa. Quanto aos religiosos, temos que esperar a reação deles. Mas, vocês, são donos de seus corações e, a meu ver, eles devem ficar onde estão.

          __Então, Artur, o que fazemos?

          __Simples, Alice. Peça à Nanci para ir à Adega buscar a melhor Champanhe. Vamos comemorar um noivado...

          __Não é necessário pedir, dona Alice, já estou indo para a Adega.

          Alana, muito feliz, abraçou o meu pai agradecendo, enchendo-o de beijos, mas, meu pai fez algumas ponderações.

          __Alana, não pense que você me convenceu apenas com o seu procedimento agora. A sua coragem, a sua emoção e a segurança em suas palavras foram sim, decisivas para não adiarmos essa verdade. Mas, Eu e Alice, como também, Nanci, nunca soubemos lidar com os sentimentos que, desde crianças, vocês tiveram um pelo outro. Não era um sentimento qualquer. Nunca foi um sentimento qualquer. Por não sabermos o que fazer, nós vínhamos adiando essa verdade. Vocês sempre se amaram. Mas, Alana, como você mesma disse, mais de uma vez em sua súplica, você tem pouco mais de quinze anos, portanto, judicialmente você ainda é uma criança. Enzo, sim, é adulto. Mas, pelo que todos ouvimos, você falou por ele e por você. Subentende-se, como você mesma disse, o seu amor não pode ser legislado. Danem-se os preconceitos. Mas, nenhum casal deve se unir sem as bênçãos de Deus e, as igrejas vão contestar, ou, no mínimo pedir autorização judicial. Principalmente porque você, Alana, é menor de idade.

Neste momento Nanci volta com geladas champanhes e, todos brindaram aquele noivado impossível de ser evitado. Depois do brinde, Nanci intimou a todos que almoçassem. Enquanto almoçavam, Nanci desapareceu da sala. Voltou em instantes e, com as mãos escondidas atrás das costas, ela começou a falar.

          __Meus meninos travessos que eu tive a felicidade de ver crescer, de acompanhar o seu amor, de temer que vocês não pudessem se unir. Eu pensava que teríamos um trabalho muito grande para convencer Sr. Artur e Dona Alice a abençoar a união de vocês. Mas a “oração” de Alana facilitou a nossa missão. Vocês não desconhecem que eu trabalho para esta família há mais de vinte anos. Sabem que eu ganho um ótimo salário e não tenho nenhuma despesa. Todo o dinheiro que eu ganhei trabalhando com vocês está aplicado se multiplicando.

          __Alice, aonde Nanci quer chegar?

          __Calma Artur, não a interrompa.

          __Quero, não, patrão. Eu já cheguei. Como eu estava dizendo, eu pude acompanhar e apostar nesta paixão. Quando o outro dia eu os peguei se beijando dentro do carro na garage eu senti que não conseguiriam mais se livrar um do outro. Uma outra noite, eu tive que fechar a porta do quarto por fora para protegê-los um do outro. Agora, enfim, um noivado. Mas, usando muito de minha economia eu comprei uma coisa linda para vocês dois. Não é nada ruim. É coisa muito boa. Não pode existir noivado sem aliança, então eu comprei um par de alianças para vocês... E, entregando o lindo estojo para Enzo, pediu que eles as colocassem um no outro.

Era realmente um lindo par de alianças, da altura da fortuna deles. Nanci realmente gastara um bom dinheiro.

          __Mas Nanci... as alianças nos serviram direitinho. Como você sabia as medidas de nossos dedos?

          __Alana, minha menina, vocês deixam seus anéis em cima de qualquer móvel, não foi difícil. Vocês têm dinheiro para comprar alianças muito mais valiosas...

          __Nunca que iremos trocar, não é Alana? Vai ser um orgulho carregar este presente em nossos dedos. Mas, você não deveria...

         __Parou, parou, parou... O dinheiro é meu e o prazer também. Eu amo vocês. E digo mais. Eu vou dizer que sou a mãe de Alana para facilitar as coisas e vamos casar vocês no convento que a socorreu.

          __Boa ideia Nanci.

          Eu e Alana fomos abraçar, beijar e agradecer a Nanci por tanto apoio que nos dava. Na mesma hora Alana ligou para a Madre Superiora. Disse que queria se casar lá em agradecimento aos cuidados e acolhimento de fora merecedora. Todas as religiosas quiseram falar com Alana. Até o Monsenhor ficou muito feliz com a ideia. A minha mãe pegou o telefone e agradeceu imensamente por elas terem salvado Alana. A minha mãe perguntou se podiam ir lá para conversarem pessoalmente. Tudo ficou combinado e foram já no outro dia.

          O meu pai disse que não haveria necessidade de mentir. Não haveria necessidade de Nanci dizer que era a mãe de Alana. A história dela era a verdade necessária. Não se pode querer as bênçãos de Deus com mentiras.

          No dia seguinte todos viajamos para lá. Meu pai levou a carta da suicida que estava cuidadosamente guardada. Vídeos dos painéis cravados em duas paredes do quarto de Alana om fotos da mãe dela. Até um jornal com a foto do corpo da jovem quando fora encontrada pela polícia, enforcada. Alana não participou da conversação que eu, meu pai, minha mãe e Nanci tivemos com a Madre Superiora e o Monsenhor. Meus pais mostraram que obedeceram a vontade da mãe dela e, apenas a deram abrigo, carinho, amor demais, mas, nunca se portaram como pais, em respeito ao sofrimento de Alessandra Schneider, mãe de Alana. A tatuagem, na face interna do braço esquerdo de Alana, onde se via o rosto lindo da mãe dela, com a descrição “Amor da minha vida”, foi o ponto final daquela verdade. Enquanto isso Alana fazia a festa com as caridosas salvadoras. Marcamos o casamento para a semana seguinte. Voltamos para o Brasil.

          A minha mãe, Nanci e Alana saíram para fazer compras de roupas para a jovem noiva. Ela viajaria apenas com o necessário e, quando chegássemos ao nosso destino, na Austrália, onde moraríamos, compraríamos tudo mais necessário.

          Enquanto isso, meu pai me instruía e me documentava para eu assumir todos os seus negócios na Austrália. Vários de seus Hotéis para Idosos já funcionavam na costa Australiana do Oceano Pacífico. Eu e Alana nos casaríamos e iríamos morar em uma cidade litorânea da Austrália, muito rica, muito divertida e escandalosamente bonita- Gold Coast.

         __Meu pai, eu estou fazendo certo em Amar Alana?

          __Por que a dúvida, meu filho? Você quer mudar de ideia, está arrependido? É por ela ser uma criança de, como ela afirma, “de pouco mais de quinze anos”?

          __Não, não papai. Desde que Alana veio para esta casa, eu me sinto mal quando estou longe dela. Eu a quero para mim, mas, estou sentindo que a estou roubando de você, de mamãe e, até mesmo de Nanci.

          __Não meu filho. Você não tem ideia de como eu e a sua mãe, em todos estes quinze anos, nos angustiamos quando começamos a perceber que vocês se queriam de uma forma diferente. Vocês, meu filho, se olhavam diferente, se cuidavam diferente, se respeitavam diferente. Vocês, meu filho, sofriam diferente com o sofrimento do outro. Nós não apoiaríamos esta união se esta paixão sua por ela tivesse surgido agora, recentemente, por ela ser muito bonita, elegante, simpática e, muito sensual. Acharíamos que poderia ser apenas uma atração sexual inconsequente e passageira. Mas, repetindo, há “pouco mais de quinze anos” que vocês se entregam um para o outro. Eu, meu filho, a sua mãe e Nanci, não temos dúvidas que vocês sempre se entregaram em benefício do outro e, esta entrega, meu querido, tem nome. Esta entrega se chama amor.

          __Parece que eu a estou roubando de vocês, não?

           __Meu filho, infeliz de quem não crê nos traçados de Deus. Esta expressão vai ficar marcada de tanto que está sendo usada, mas, recorde: há pouco mais de quinze anos eu comprei esta mansão maravilhosa, encravada neste sítio mais maravilhoso ainda. O incêndio em nossa casa e a trágica morte de seus avós nos trouxeram para cá. A bebezinha Alana foi colocada nesta varanda, para quem aqui morasse cuidasse dela. Outro cuidaria dela, ou não, se eu não tivesse acabado de mudar para cá.

          __Eu não a estou roubando de você e mamãe?

          __Sim. Não você, mas, o amor inocente que abraçou “vocês crianças”. Sim, ela nos foi roubada, primeiramente, pela carta da mãe dela encontrada na caixa de papelão junto com a bebezinha Alana. Aquela carta nos obrigou, a mim e à sua mãe, a não almejarmos ser os pais dela.

          __Verdade papai. Você fez tudo exatamente como a mãe dela pedira.

           __E, tem mais. Não sei se Alana deveria saber disso. Eu tenho muita dúvida a respeito. Apenas eu e a sua mãe, sabemos. Nem Nanci sabe, pelo menos ainda.  Enquanto a sua amada está distraída com compras. Vamos fazer um passeio. Eu vou lhe mostrar algo.

          Eu e meu pai saímos de carro. Eu não sabia onde ele estava me levando. Enquanto dirigia o veículo, ela repassava os detalhes da função que eu iria assumir em Gold Coast na Austrália, depois do casamento. Quando chegamos ao destino, eu me assustei.

          __Um cemitério, papai?

           __Sim. Venha comigo.

           Quando entramos, meu pai chamou um funcionário e lhe pediu que nos levasse à mais bonita catacumba daquele cemitério. O funcionário não titubeou e nos levou a um majestoso sepulcro, muito conservado, com flores frescas. No mausoléu tinha uma linda foto tirada do pen drive que estava na caixa de papelão com a inscrição:

“VOCÊ NÃO SERÁ ESQUECIDA, ALESSANDRA SCNEIDER. A SUA FILHA SEMPRE SERÁ SUA FILHA”

          __Oh! Meu pai... Ela não foi enterrada sem documentos?

          __Não, meu filho. Através de um advogado eu requisitei o direito de enterrar o corpo enquanto estava no IML e consegui. Era o mínimo que o meu dinheiro poderia fazer em agradecimento à mais bela alegria que ela havia colocado na varando de nossa mansão. Vamos embora. Agora você sabe bem o que fazer em Gold Coast, em nossos empreendimentos. Case. Vá ser feliz. Alana agora, como sempre me pareceu ser, é de sua responsabilidade. Faça-a feliz. Se ela quiser ver, traga-a aqui. Mas, não insista.

          As mulheres da minha vida voltaram das compras. Alana estava radiante com aquela linda aliança em seu dedo direito, ainda. Já não tínhamos mais preconceitos a respeitar e nos beijamos com carinho. Mais tarde ela quis ver o jazigo de sua mãe. Agradeceu muito a dona Alice que sempre trocava as flores que enfeitavam aquela lembrança. Como nos outro dia iriamos nos casar no Convento e, definitivamente, mudarmos para a Austrália, ela quis visitar e se despedir de amigas. Não poderia falar de casamento, apenas mudança a trabalho. Nós andamos durante toda a manhã encontrando os nossos amigos. À tarde, quando chegamos, Nanci nos esperava para almoçar. Meus pais haviam saído para verificar a checagem do seu jatinho particular que nos levaria para o casamento e, depois, em lua de mel para Gold Coast, na Austrália.

          __Meninos, venham almoçar. O almoço hoje é o que vocês mais gostam.

          __Nanci, antes de almoçarmos nós vamos nos banhar na cachoreira. Depois nós almoçamos. Tudo bem?

          __ Fiquem à vontade. Eu vou sair. Não gostei do vestido que comprei para o casamento. Vou na loja trocar. Se eu demorar podem aquecer no micro-ondas, ou, me aguardar.

          A gente se trocou rapidamente e fomos nos deliciar na cachoeira. Estava muito calor. Sentiríamos saudades daquele recanto encantado. Mergulhamos no rio apenas nos admirando. Pássaros e borboletas mudaram os seus hábitos e, vieram enfeitar a nossa tarde de despedida. Animaizinhos da floresta também nos observavam das margens. O meu velho cão, Bowie, parecia temer que não nos víssemos mais e, nos lançava um olhar interrogativo deitado na grama fofa. Nadamos muito, nos beijamos muito, mas, não passamos disso. Cansados, voltamos para a mansão. Nanci acabara de chegar. Fomos nos banhar e, a comida já voltara para a mesa, mas, era mais jantar do que almoço. Estávamos famintos. Comemos bem depois de, sob protesto, eu degustar uma taça de vinho.

          No outro dia, no convento, nos casamos em uma cerimônia tão simples quanto emocionante. Um gostoso bolo de casamento nos foi oferecido. Muita emoção na despedida e, felizes embarcamos no Jatinho para Santiago, no Chile onde passaríamos aquela noite. Do Aeroporto, de táxis, fomos para um luxuoso hotel no centro da cidade. Estávamos cansados. Fomos nos banhar e nos amamos intensamente, agora, sem remorsos, sem medos e livres de possíveis preconceitos. Como dissera Alana, não se devia legislar o amor. Depois do banho na luxuosa suíte, eu a carreguei nua para o leito e, esquecendo o cansaço, novamente nos amamos louca e apaixonadamente. Dormimos alguns minutos.

           __Alana, acorda meu bem. Vamos descer e jantar.

           __Eu estou mesmo com fome, Enzo. Mas, eu gostaria de passear no centro. Eu quero jantar em um restaurante no centro. Mas vou me banhar primeiro, pois, estou muito suada. Fique ai. Não venha atrás de mim. Depois você se banha. Combinado?

          __Sim, claro. Combinado.

         Alana se banhou rapidamente. Saiu do banheiro e, enquanto ela se trocava, eu fui me banhar. Mas, eu já estava pronto para sair quando, ainda debaixo d’água, ela me abraçou pelas costas. Essa criança é mesmo uma criança. Nos abraçamos e nos beijamos ardentemente, mas, ela já havia se trocado e se molhou todinha. Com a roupa ensopada ela dava risada. Eu a ajudei a tirar a roupa molhada, a sequei com carinho, também dando boas risadas. Cheios de felicidades descemos e um carro do Hotel nos levou para um famoso restaurante. Famoso, lindo, aconchegante, tanto quanto caro, no centro.  Nós andamos um pouco antes de irmos jantar.

          No restaurante antes de escolhermos uma mesa, nos sentamos em torno do balcão do bar. Alana quis pedir algo para beber e, me assustei quando ela pediu uísque.

          __Alana, você é menor, não pode beber. Você nunca bebeu.

          __Também, até hoje, eu não tinha casado.

Então eu nada pedi, pois, sabia que ela não conseguiria beber. E, não deu outra. Tentou não fazer cara feia, se engasgou, mas engoliu o primeiro gole. Eu tomei dela, bebi um gole e, a convidei para dançar lindas músicas que enchiam o ambiente de romantismo.  Primeiro, ela me beijou leve e docemente nos lábios. Depois, exigiu condições para aceitar e, dançar...

          __Diga que o nosso amor não morre. Diga que a minha felicidade não é uma fantasia, não é um “anjo vagabundo”. Diga que a minha felicidade é eterna.

          __Todos na nossa casa confirmaram, até repetindo a sua expressão, que nós nos amamos “há pouco mais de quinze anos”.

          Então dançamos muito, jantamos muito, passeamos pelos arredores do lindo centro turístico de Santiago. E, cedo, no outro dia, embarcamos no luxuoso e veloz jatinho de meu pai. Voamos aproximadamente quinze horas cortando o Oceano Pacífico e, aterrissamos em nosso destino, Gold Coast, na Austrália.

          Alana adorou tudo por lá. Tudo era belo, as pessoas eram belas e alegres. Uma cidade rica, universitária, turismo rico e sustentável. A ideia inicial era curtimos a nossa esperada “lua de mel”, por quantos dias quiséssemos e, depois, eu assumiria a administração das dezenas de hotéis de meu pai.

         Viajamos muito por todo o país australiano. A cada dia, mais nos amávamos. Alana era sim, uma criança, mas era o “amor da minha vida”.

           Sempre deixando espaço para amor de Alana, eu assumi os negócios de meu pai em Gold Coast.

 

 

fim